VIII Encontro Nacional da Ação Popular Socialista – APS/PSOL
O Capitalismo é barbárie, desigualdades e morte
A profunda crise que o capitalismo enfrenta hoje, resultado da convergência da crise econômica com a pandemia, trouxe como resultado o aprofundamento da exploração do capital sobre o trabalho, a concentração de renda e riqueza, o parasitismo rentista, o aumento da dominação dos países do centro imperialista sobre os países dependentes da periferia e o incremento da pobreza, da miséria e da fome.
Aprofundou também as opressões de raça, de etnia, de gênero contra as mulheres e LGBTQIA+, da xenofobia, violência, desigualdades, discriminações, exclusões e opressões as mais diversas. Enfim, há um agravamento das desigualdades sociais de todo tipo e a concentração de riqueza enriqueceu ainda mais os bilionários e multimilionários em diversos países como EUA ou China, Brasil ou Nigéria, Israel ou países árabes, Rússia ou Ucrânia etc.
- Esta tem sido a mais profunda depressão econômica desde a crise de 1929 e o pior momento desde a crise estrutural do capitalismo iniciada na década de 1970. Antes disso, o pior pico da crise tinha sido em 2007/2008.
A Crise do capitalismo é profunda e múltipla
- Desde o V ENAPS (2012) temos dito que a crise mundial não é só econômica e financeira e que “Vivemos um período de Crise Estrutural crônica do capital em nível mundial, que é um processo de crise múltipla: econômica, financeira, social, ambiental, energética e alimentar, com fortes componentes políticos e culturais”[1] . Desde 2007, ela se situa principalmente nos centros capitalistas históricos, como os EUA, a Europa e o Japão, mas atinge todo o planeta. Não há sinais de saída “virtuosa”. Agora, é também uma crise sanitária.
- Não houve saída daquele pico da crise dentro da crise estrutural e o ano de 2019, antes da pandemia, já anunciava uma piora do quadro econômico.
- Tentando enfrentar o aprofundamento da crise, os estados burgueses, como regra geral, tiveram que estimular a economia. É uma política econômica diferente das políticas neoliberais que vinham sendo aplicadas anteriormente (mas, em parte, já aplicadas pontualmente em 2008). Porém, convivendo com privatizações, ao mesmo tempo que, em termos de políticas sociais, não há indícios de nada como um retorno ao “Estado de Bem Estar Social” (EBES).
Neokeynesianismo, pandemia e incógnitas
- Há uma espécie de neokeynesianismo em termos de ações dos estados para estimular a economia, mas sem combinação com o retorno de políticas do EBES, diferente daquilo que aconteceu no período após a Segunda Guerra Mundial. Ou seja, o neokeynesianismo não é incompatível com políticas sociais neoliberais, quebra de direitos, aumento da dívida pública e financeirização da economia.
- Essa não é uma escolha aleatória dos estados capitalistas em geral e dos EUA em particular. Não é uma questão de preferência ideológica ou de princípios e fundamentos econômicos abstratos, entre “neoliberalismo radical” e “neokeynesianismo”. Trata-se de uma questão de sobrevivência para o grande capital em geral e para os seus estados centrais, particularmente os EUA, para enfrentar a concorrência com a China.
- Diante do aprofundamento da crise, o estado burguês não tinha outra saída. Não são suicidas. Mas isso tem gerado maiores déficits fiscais e dívidas públicas cada vez mais impagáveis. Até quando isso pode dar resultados paliativos, ainda é uma incógnita.
- Em 2021 houve uma relativa melhora na situação econômica mundial com uma recuperação do crescimento, mas a crise estrutural mundial do capitalismo continua. Já vinha se agravando antes da pandemia, com sinais fortes de que 2020 seria um ano ruim, com todas as consequências negativas para as condições de vida do povo trabalhador, especialmente em economias dependentes. A melhora econômica em 2021, 2022 e 2023 não significa saída de crise. De acordo com o Banco Mundial BM), considerando a queda do Produto Mundial de -3,4% em 2020 e estimativas e previsões de crescimento para 2021 (5,5%) e 2022 (4,1%), teremos uma média de crescimento de apenas 2,1% anual nos três anos. Para 2023, a previsão é de 3,2%. Para o FMI, a estimativa de crescimento em 2021 foi de 5,9% e as previsões para 2022 e 2023 são, respectivamente, de 4,4% e 3,8%[2].
- O BM apresenta ainda as estimativas de crescimento em 2021 e previsões para 2022 e 2023 por regiões e países. Os melhores resultados esperados são para os países do Leste e Sul da Ásia. Mais baixos para “Economias avançadas” (EUA, Zona do Euro e Japão) e América Latina e Caribe. Para a China, os dados indicam, para os três anos, respectivamente: 8,0%, 5,1% e 5,3%. Para os EUA, 5,6%, 3,7%, 2,6%. Para a Zona do Euro, 5,2%, 4,2%, 2,1%. Para o Japão, 1,7%, 2,9% e 1,2%. Como se vê, o crescimento da China continua sendo bem maior que a média mundial, porém caindo progressivamente e não sendo mais o dobro da média mundial, como era antes.
- O arrefecimento da pandemia cria condições de melhora do quadro econômico, mas deixando gargalos importantes. Entre 2020 e 2021, além de agravar a crise econômica, também expôs todos os problemas históricos, estruturais e superestruturais do capitalismo em sua atual fase imperialista, tanto do ponto de vista econômico e político como ambiental.
- A crise climática, agravada pela superexploração capitalista dos recursos socioambientais nas últimas décadas, impõe novos limites e coloca em risco a própria humanidade. A superexploração dos recursos até a exaustão pelos capitalistas nos deixa à beira de um ponto de “não retorno” em relação ao equilíbrio ecossistêmico. Não há planeta B e é justamente por isso que cada vez mais a luta anticapitalista deve ser ecossocialista, combatendo o imperialismo ecológico e a desigual troca econômica entre países do centro e da periferia capitalista, que hoje estabelecem zonas de sacrifício (principalmente os países da América Latina e África). A defesa da vida sobre o planeta vai assumindo uma nova dimensão. As forças democráticas, populares e socialistas devem lutar pela redução drástica da emissão de gases de efeito estufa, priorizar o uso de sistemas agroecológicos, realizar uma reforma agrária e urbana sob o controle da classe trabalhadora e planejar estratégias que rompam com a lógica mercantil e trabalhem na perspectiva de uma relação de equilíbrio entre a humanidade e a natureza. Qualquer perspectiva de recuperação econômica deve considerar esses aspectos, mas mesmo as possibilidades nos marcos atuais não são promissoras.
As previsões econômicas não são boas
- Há uma série de fatores que estão complicando uma recuperação econômica. A convergência da crise econômica com a pandemia e o descompasso no seu combate entre os países, concomitantemente com o aprofundamento da bipolarização interimperialista, provocou, além da recessão, uma desorganização e desequilíbrio dos processos produtivos, característicos da anarquia da produção no capitalismo: crise energética, alimentar, ambiental, de semicondutores (microchips), quebrando as cadeias globais de produção e distribuição, de logística, de desequilíbrios entre oferta e demanda de contêineres nos portos e de uma inflação que vem ganhando dimensão mundial.
- Além disso, a pandemia resiste, mesmo com o avanço da vacinação, em parte favorecida pelos polos de negacionismo e resistência à vacina e ao isolamento social, que continuam sendo estimulados por grupos mais à direita em vários países. Nos EUA, cerca de 25% da população continua se negando à vacinação. Além disso, a aplicação das vacinas continua muito desigual entre países mais desenvolvidos e mais pobres, refletindo as marcas classistas e racistas da desigualdade mundial.
- Continuam os riscos de novas pandemias, pois o desequilíbrio ecológico se expande conforme o capital submete novos espaços à sua reprodução. As regiões subtropicais do planeta tiveram o seu espaço reorganizado de acordo com a lógica das indústrias. Entre a I Revolução Industrial e a II Guerra Mundial esses espaços passaram por transformações radicais na política, no sistema produtivo e na ecologia.
- Após a II Guerra Mundial, a superação do fordismo pelo toyotismo modernizou o sistema produtivo nos países desenvolvidos e terceirizou parte do sistema produtivo industrial para países menos industrializados, que passaram por uma industrialização tardia e uma urbanização acelerada.
- Em seguida à crise dos anos 1970, a indústria mais avançada (tecnopolos) mantém sua concentração nos países desenvolvidos, mesmo com o forte deslocamento da indústria para o sudeste asiático. Essa concentração industrial atual contribui para a forte poluição atmosférica dessas regiões, que ainda têm como fonte energética os combustíveis fósseis, apesar da transição energética já em curso nesses países.
- Depois os anos 1970, o capital financeiro avançou sobre a América Latina e África, por meio das commodities agrícolas e minerais, financiando o desmatamento e a grilagem de terras nesses continentes, produzindo conflitos com os povos originários e tradicionais e colocando em risco o equilíbrio climático nessas regiões.
- Com isso, a América Latina e a África se tornam o epicentro para a construção de uma estratégia ecossocialista. O avanço do capitalismo sobre as florestas equatoriais, além de gerar conflitos territoriais com os povos e comunidades tradicionais dessas regiões, pode gerar novos patógenos e criar novas pandemias, além de provocar mudanças climáticas nos continentes que têm na agricultura a principal geradora de divisas das elites regionais e também de subsistência dos povos.
- No período mais recente, houve um enfraquecimento tanto da “ofensiva conservadora” quanto da “resistência popular”. Não houve nenhuma nova vitória importante das forças mais conservadoras e de extrema direita que, ao contrário, sofreram algumas derrotas importantes como nos EUA, Israel, países nórdicos, Alemanha e em parte da América Latina. Mas isso não significa que tenha havido vitórias de forças políticas realmente de esquerda, mas de liberais, social democratas liberais e verdes liberais.
- Biden venceu Trump, mas, como esperado, isso não significou democratização das relações do EUA com o mundo. Pode trazer algumas melhorias nas condições de vida do povo nos EUA, seja pela política de enfrentamento racional da pandemia, como de fortes investimentos do estado para estimular a economia (para se recuperar da queda de 3,5% do PIB em 2020) e atenuar as nefastas consequências sociais, seja pelo enfraquecimento de políticas mais conservadoras e reacionárias nos costumes e contra imigrantes, negros, latinos, mulheres e população LGBTQIA+. A estimativa de crescimento do PIB dos EUA em 2021 foi de 5,6% (BM e FMI).
- Vivendo um momento de forte polarização social, devido ao aumento da desigualdade, e conflitos político-ideológicos entre os próprios grupos dominantes, os EUA precisaram fazer isso para recompor uma unidade interna sob a hegemonia do capital e ter melhores condições de enfrentar o seu principal desafio geopolítico, que é a disputa interimperialista com a China.
A disputa interimperialista se aprofunda
- Assim, a bipolarização interimperialista sofre algumas mudanças. As agressões dos EUA no mundo vão continuar, mas estão passando por algumas mudanças de foco.
- O novo governo dos EUA escolheu a China como principal inimigo em conjunto com a Rússia (até o governo democrata anterior, de Barack Obama, o inimigo principal era a Rússia; para Trump, era a China). Assim, procura também manter pressão sobre a Rússia, especialmente estimulando provocações em suas áreas de fronteira (países da ex-URSS) como Ucrânia, Belarus, guerra do Azerbaijão (aliado dos EUA, Turquia e Israel) contra a Armênia (mas próxima da Rússia) e no Cazaquistão. Até o início da guerra na Ucrânia, esses conflitos vinham fortalecendo a Rússia e, indiretamente, a China.
- O governo Biden continua tentando isolar a China. Mas mudou alguns métodos. Agora, a prioridade é a disputa tecnológica (com projetos comuns com outros países) e tentando romper um certo isolamento provocado pela ostensiva política de Trump, chamada de “America First”, que gerou muitos atritos na relação com aliados históricos dos EUA como a Europa continental, Canadá e Japão. Busca manter ou reaglutinar alianças com Índia, Japão, Austrália, Coreia do Sul e Taiwan.
- Em especial, está promovendo uma revitalização do QUAD (Diálogo de Segurança Quadrilateral, que articula EUA, Índia, Japão e Austrália desde 2007 e inaugurou o AUKUS, um pacto militar entre Austrália, Reino Unido e EUA.
- Tentam se aproveitar de disputas regionais envolvendo os chineses, particularmente no Mar do Sul da China, com o objetivo de maior aproximação com os países da região, inclusive o Vietnã. Também buscam recuperar espaços perdidos na África e América Latina.
- Portanto, os EUA têm um grande desafio, que é o de fazer frente ao adversário mais forte que teve desde o início da crise estrutural do capitalismo, ao mesmo tempo que vê um crescimento da polarização política, social e ideológica dentro do próprio país.
- Porém, essa não será uma tarefa fácil, pois a China vem aprofundando suas relações de interdependência econômica com países europeus tradicionalmente aliados dos EUA (como Itália e Alemanha) e assinou um grande “Acordo Abrangente de Investimentos” mútuos com a União Europeia, no final de 2020, pouco antes da posse de Biden. Este acordo, conhecido como CAI, substituiu e superou 26 acordos anteriores.
- Em 4 de fevereiro de 2022, China e Rússia patrocinaram um dos fatos mais importantes ocorridos até aqui no século XXI, assinando uma declaração com um pacote de acordos que foi chamado de “aliança ilimitada”.
- Mas não foi uma novidade absoluta. Essa aliança está sendo construída há mais de dez anos e já tinha se manifestado, na sua essência, nos acordos feitos entre os dois países em 2014, após o golpe na Ucrânia e a tentativa de golpe na Síria (dois únicos países onde a Rússia manteve grandes bases navais/militares fora de seu território depois do fim a URSS).
- Ali estava se iniciando o que veio a ser chamado a nova “guerra fria”, ainda no governo Obama. Agora, os acordos estão mais atualizados e aprofundados, e as declarações mais detalhadas e incisivas. Enfim, apesar do discurso multilateralista (padrão da China), esse foi mais um passo no processo de aliança China-Rússia e da bipolarização interimperialista.
- A declaração defende os termos de uma ordem mundial liberal institucionalmente sem protecionismos, bloqueios e sanções e baseada no multilateralismo. Isso é o melhor para seu avanço e competição com outras potências e, inclusive, para fortalecer as relações imperialismo-dependência com os países da periferia. Entretanto, não esqueçamos que a ordem mundial que estão defendendo foi feita para favorecer as grandes potências e não os países dependentes, como o Brasil. Mas, eles sabem que não haverá multilateralismo, pelo menos no curto prazo. E estão organizando seu bloco na bipolarização.
- Ademais, a aliança China-Rússia se aprofunda e reforça uma aliança mais consistente com o Irã (que é importante força regional), com quem assinou um acordo muito abrangente (comércio, investimentos, financiamentos e tecnologia, inclusive no setor militar), de 25 anos, no valor de 400 bilhões de dólares (cerca de 2 trilhões e 300 milhões de reais em valores de hoje). Isso traz muitas vantagens econômicas e geopolíticas para a China, enquanto deixa o Irã menos tensionado para enfrentar as sanções econômicas aplicadas desde o governo Trump e discutir o acordo nuclear com os EUA e a Europa. Ao mesmo tempo, essa potência regional dá sinais de que está avançando na sua indústria nuclear.
- O país que melhor enfrentou a crise/pandemia foi a China. Única entre as grandes e médias economias que não teve queda do PIB em 2020 (cresceu cerca de 2,3%) e teve um crescimento de 8,1% em 2021 (dados do FMI e Escritório Nacional de Estatística da China).
- Conseguiu isso devido seu crescimento anterior, a científica e dura política de combate à pandemia e a forte capacidade do estado de intervir não somente na economia e nas medidas sanitárias, mas também no controle social e político de sua população. Isso, por ser um estado autoritário, mas que, ao mesmo tempo, tem autoridade reconhecida pela maioria de sua população.
- A China vem ultrapassando os EUA, os países europeus e os asiáticos aliados dos EUA (especialmente Japão, Coreia do Sul e Taiwan) em vários ramos tecnológicos, como a Internet 5G. Mas ainda tem várias lacunas importantes, como na produção e capacidade inventiva de semicondutores (microchips) o que tem trazido alguns gargalos estruturais. Isso porque depende de importações, e os EUA têm pressionado os principais produtores a não exportar nem os microchips (Taiwan e Coreia do Sul) nem as tecnologias e máquinas (Holanda) para sua produção pelos chineses.
- Porém, apesar de todos os protecionismos, pressões e bloqueios promovidos principalmente pelo imperialismo estadunidense, a China foi quem mais cresceu em 2020 e 2021, mais exportou, manteve um grande superavit comercial com os EUA e o mundo, avançou em relações comerciais na Europa e incrementou a exportação de capitais (investimentos e financiamentos) para outros países. Mas, ao mesmo tempo, a China foi o país que mais atraiu investimentos de capitais externos em 2020, aprofundando, assim, sua integração com a ordem capitalista mundial.
- A “Nova Rota da Seda” é um instrumento muito especial (e sem competição abrangente dos EUA) de expansão econômica, tecnológica, diplomática e militar (mesmo que moderadamente e em sentido dissuasivo) do imperialismo chinês, tanto nas relações com países da Eurásia (Ásia, Europa, Oriente Médio) e África, como também já se estendendo para a América Latina, como demonstra o recente acordo assinado com a Argentina.
- Na Ásia, em 15 de novembro de 2021, depois de vários anos de negociações, foi formalizada a RCEP (Parceria Econômica Regional Abrangente), formada por 15 países asiáticos. Os 10 que já faziam parte da ASEAN (Associação das Nações do Sudeste Asiático) mais a China, Japão, Coreia do Sul, Austrália e Nova Zelândia, se tornando o maior bloco econômico do mundo.
- Além disso, desde 2001, foi formada a Shanghai Cooperation Organization (SCO) para comércio e segurança, composta por China, Rússia, Cazaquistão, Quirquistão, Tadjiquistão e Uzbequistão, reforçada em 2017 com a entrada de Índia e Paquistão.
- Ademais, a China tem avançando bastante na África (e pode ser tarde para EUA e Europa recuperarem terreno), na América Latina (onde é o maior parceiro comercial, inclusive com países governados pela extrema-direita, como o Brasil) e no Oriente Médio, onde amplia relações econômicas e diplomáticas (inclusive com países tradicionalmente aliados incondicionais do EUA, como Israel, Turquia e Arábia Saudita). Além disso, após a vitória do Taleban no Afeganistão, está ampliando sua presença diplomática e econômica naquele país vizinho.
- O mundo vive também uma corrida armamentista e aeroespacial entre as grandes potências, não somente em termos quantitativos, mas principalmente visando uma modernização de suas respectivas capacidades militares diretas e indiretas (“terceirizadas”, para aliados e empresas privadas).
- Tudo isso tem estimulado uma série de novos conflitos regionais (além dos que envolvem mais diretamente China e EUA), como: guerra do Azerbaijão contra a Armênia, tensões entre o Azerbaijão e Irã, da Turquia com o Irã, entre a Ucrânia e a Rússia, entre a Coreias (teste de mísseis). Além dos conflitos já existentes na Síria, Iraque, Líbia, Somália, Iêmen, Sudão, e os já tradicionais confrontos de Israel com diversos países, especialmente com o povo palestino e a ocupação criminosa de seu território etc.
Nem OTAN, nem EUA, nem Rússia oprimindo o povo da Ucrânia!
- É dentro desse contexto internacional e quadro regional, que podemos entender o conflito que está ocorrendo na Ucrânia. Diante da invasão da Ucrânia pela Rússia, a CNAPS divulgou uma declaração, em 28 de fevereiro de 2022 que, em síntese, tem o seguinte conteúdo:
- A situação em torno dos conflitos na Ucrânia é complexa e envolve um conjunto de fatos históricos com interpretações diferentes e fatores dos contextos nacionais e internacional contemporâneos. Ademais, os conflitos ocorrem num momento de agravamento da crise estrutural do capitalismo, quando se acirram as disputas por energia, matérias primas, mercados e tecnologias avançadas.
- Assim, a invasão da Ucrânia pela Rússia deve ser entendida no quadro do conjunto das contradições presentes na disputa interimperialista que está ocorrendo em nível internacional. Encabeçada, de um lado, pelos EUA e países da União Europeia e Japão e, de outro, pela aliança entre a China e Rússia.
- Essa disputa é econômica, tecnológica e geopolítica e militar e se manifesta de várias formas, inclusive em conflitos nacionais e regionais. Como consequência dessa situação, há uma corrida armamentista e uma escalada militar em várias regiões do planeta.
- No caso específico, o conflito que gerou a guerra tem na sua origem mais recente a expansão da OTAN para o Leste Europeu, que se deu progressivamente desde a auto-extinção da URSS (1991) e, mais recentemente (2014), a um golpe de estado que derrubou o governo aliado da Rússia na Ucrânia. Mas a Ucrânia não é um território, país ou estado pertencente à Rússia. Depois da revolução russa de 1917, a Rússia soviética reconheceu (em 1919) a Ucrânia como sendo um outro estado, portanto independente. Em 1922, a Ucrânia optou por participar como estado membro da União Soviética. Mas essa foi uma opção livre, e manteve a sua independência e identidade nacional.
- O princípio orientador dos revolucionários comunistas é autodeterminação dos povos, na perspectiva do internacionalismo e do fim das fronteiras nacionais, em sua grande maioria construções artificiais e arbitrárias. Mas isso só pode ser alcançado quando o povo se livrar do jugo do capital, a fim de que todas as decisões sobre fronteiras e nacionalidades sejam tomadas de forma democrática e voluntária, respeitando as diversas culturas, etnias e populações tradicionais.
- Portanto, condenamos a invasão da Ucrânia pelas tropas da Rússia. Isso, de modo algum, significa compactuar com a OTAN e com os países imperialistas que a constituem, como os Estados Unidos (principalmente) e outros como o Reino Unido, Alemanha, França, Itália.
- A OTAN é o principal instrumento militar conjunto dos EUA e dos países imperialistas do ocidente europeu, tanto para sua expansão militar como econômica. Mas também é uma garantia de ordem interna desses países em eventuais situações revolucionárias populares. Portanto, deve ser combatida e repudiada por todos os lutadores de todos dos povos. Os Estados Unidos, através da OTAN ou de decisões unilaterais, têm sido e continuam sendo o principal inimigo dos trabalhadores do mundo, especialmente os dominados, dependentes e oprimidos, e pretende continuar se expandindo.
- Mas isso não naturaliza as agressões militares diretas da Rússia a outros países como a Ucrânia. Todos os envolvidos no atual conflito são países capitalistas, com estados burgueses opressores dos trabalhadores, mesmo que cada um com suas características nacionais particulares.
- Pela extinção da OTAN e retirada dos mísseis da OTAN dos países do Leste Europeu! Pelo fim da guerra e retirada das tropas da Rússia e de todas as tropas estrangeiras, assim como do envio de armas de todos os países para a Ucrânia. Respeito aos acordos de Minsk e suspensão toda ingerência da OTAN! Contra toda pretensão da OTAN de incorporar a Ucrânia e expandir suas bases militares na Europa oriental e na Europa em geral! Liberdade para os ativistas pacifistas presos na Rússia! Em defesa da autodeterminação dos povos e dos direitos de minorias nacionais internas, da autodeterminação dos povos de Lugansk, Donetsk, da Crimeia e da região de Donbass! Abaixo o imperialismo! Viva a luta pelo socialismo e pela soberania nacional dos povos oprimidos! (Íntegra da Declaração em[3]).
- Como se trata de uma situação que tende a se prolongar, não só o conflito militar em si, mas também suas consequências, teremos que acompanhar o desenrolar da guerra e fazer atualizações de análise e posição quando necessário.
- Mas não tenhamos dúvidas. Como regra geral, essas disputas não têm os interesses do povo no centro. Na Rússia, Ucrânia, Belarus e Cazaquistão, quem está no poder são elites políticas oligárquicas, herdeiras da burocracia falida que levou à crise final dos regimes burocráticos de seus países e da URSS. São todos eles regimes de direita, autoritários e conservadores, que aplicam políticas de exploração e opressão do povo a serviço de capitalistas nacionais e estrangeiros, dos seus monopólios e da concentração da riqueza.
A crise econômica sem luz no túnel
- Como vimos, a tendência geral é de recuperação econômica global em 2022. Porém, é um crescimento relativo, pois a queda foi grande em 2020 (portanto, “crescimento” significa, em grande parte, recuperação de perdas).
- As estimativas mostram também que está se consolidando um giro do polo dinâmico do capitalismo para o Oriente, a grande Ásia, tendo a China como centro. É onde o capitalismo mantém raízes mais voltadas para a indústria e a chamada “economia real” e relativamente menos para o capital especulativo. E onde ainda há grande potencial de ampliação dos mercados nacionais e regional e avanço da produção industrial e agrícola e do setor de serviços voltados para os mercados internos, regional e mundial.
- Entretanto, a bolha imobiliária na China e as medidas de controle que estão sendo tomadas pelo estado, em relação a algumas das grandes empresas privadas (como no caso da falência da Evergrande, segunda maior imobiliária chinesa, que acumulou uma dívida de 300 bilhões de dólares), comprovam não somente a vigência de relações econômicas e sociais capitalistas na potência asiática, como também que o capital especulativo, fictício, tem avançado naquele país. Por isso, o estado está tomando uma série de medidas de controle para reduzir danos e se antecipar a novos problemas. O que ocorre, entretanto, não é uma ofensiva geral do socialismo contra a burguesia e as empresas privadas, nacionais ou estrangeiras (como querem fazer crer alguns intelectuais e agrupamentos políticos, da chamada “esquerda” e da direita, no Brasil e mundo). Trata-se, efetivamente, de uma maior regulação, visando um melhor funcionamento do capitalismo.
Novas tendências e contradições na América Latina
- Na América Latina a situação econômica e social piorou e o quadro político sofreu mudanças institucionais, com a derrota eleitoral do ultraliberalismo na Argentina, do golpismo igualmente ultraliberal na Bolívia e a vitória de Lopes Obrador para presidente do México, além de um maior isolamento de Bolsonaro no Brasil. Mas as alternativas eleitas não vão além de um neodesenvolvimentismo mais ou menos fraco, como é também o caso do governo Pedro Castillo no Peru.
- Também houve a derrota da direita venezuelana na eleição do Congresso Nacional, o que levou a Europa a deixar de reconhecer Guaidó como suposto “presidente” do país, diminuindo um pouco seu isolamento. Mas Biden continua, até aqui, a mesma política de Trump. A crise econômica e social continua profunda, apesar do alívio mais imediato proporcionado pelos acordos de comércio e investimentos com a China e militares com a Rússia (e, ao que parece, também, com o Irã), que, por seu turno, também acabam aprofundando, de modo diversificado, a dependência do país.
- No meio da pandemia, Cuba deu uma demonstração de capacidade de resistência e solidariedade com dezenas de países, enviando equipes médicas para ajudar no enfrentamento da pandemia, assim como pela produção independente de sua vacina “Soberana” contra a Covid-19. Mas, tem enfrentado dificuldades para atender diversas demandas materiais básicas, o que resultou em legítimos protestos populares, em parte manipulados pelo imperialismo dos EUA. A situação imediata foi estabilizada, mas seus problemas estruturais continuam.
É preciso construir e fortalecer a Resistência Popular
- A resistência popular, tanto na América Latina como no mundo, como regra geral, está num momento de baixa, mas com potencial de retomada a partir do avanço da vacinação e controle da pandemia. É necessário enfrentar o recrudescimento da exploração, pobreza, miséria, fome e desigualdades, discriminações, exclusões e opressões diversas, que se aprofundaram durante a pandemia.
A solidariedade internacional é necessária para derrotar o imperialismo
Nossa luta é internacional!
Unidade do povo trabalhador para enfrentar a direita, o ultraliberalismo, o conservadorismo e as vertentes neofascistas!
Fortalecer a Resistência Popular contra o capital, o imperialismo e todas as opressões!
Demarcar posições com o social-liberalismo e o reformismo conciliador de classes!
Construir uma alternativa verdadeiramente de esquerda no Brasil e no mundo!
Abaixo Imperialismo, Pelo Fim da OTAN e pela retirada das tropas russas da Ucrânia!
Trabalhadores e oprimidas e oprimidos de todo o mundo, uni-vos!
Povos explorados e oprimidos, ousai lutar!
Abaixo o imperialismo e Pelo Socialismo!
Ousando Lutar, Venceremos!
VIII Encontro Nacional da Ação Popular Socialista – APS/PSOL
VIII ENAPS – Brasil – 8 a 10 de abril de 2022
[1] Ver https://acaopopularsocialista.files.wordpress.com/2016/06/v-enaps-resoluc3a7c3b5es-finais-texto-unificado.pdf
[2] A metodologia do BM, com base na economia real, ou Paridade do Poder de Compra, é diferente da usada pelo FMI, baseada no dólar. Os resultados são mais diferentes quando se trata de medir o tamanho da economia dos países (por exemplo, para o BM, a economia da China já é maior que a dos EUA desde 2015). Entretanto, quando se trata de previsões e estimativas de crescimento, os números são mais aproximados. Ademais, essas estimativas são instáveis e sempre sujeitas a muitas intempéries. Portanto, devem ser encaradas como “tendências” e não como números exatos.
[3] https://acaopopularsocialista.com/2022/02/28/nem-otan-nem-eua-nem-russia-oprimindo-o-povo-da-ucrania/