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Bolsonaro ataca educação, mas nos estados também há desmonte do ensino público. É o caso da Bahia (governada pelo PT) e Paraná (PSD). Mas há resistência e luta. Artigo de Rafael Bomfim, a seguir.

 

Precarização do ensino superior público nos estados: semelhanças entre a Bahia e o Paraná

Por Rafael Bomfim Souza*

 

Enquanto assistimos a sequência de ataques de Bolsonaro a diversas áreas, inclusive à educação, nos estados são travadas diversas lutas contra projetos semelhantes que os governadores tentam implementar. Dois desses estados são a Bahia, governada pelo PT, e o Paraná, governado pelo PSD. Projetos de desmonte do ensino público saem dos gabinetes para rondar as escolas e universidades. Mas há resistência e luta contra esses ataques. Os professores, estudantes, técnicos administrativos e toda a sociedade não vão aceitar a destruição da universidade pública e dos nossos direitos.

 

Governo Bolsonaro: desmonte da educação no Brasil – Future-se

O governo neoliberal, ultraconservador, autoritário e entreguista de Bolsonaro (PSL), Mourão, Sergio Moro, Weintraub e Paulo Guedes vem atuando, com o apoio da velha direita, dos partidos do chamado “centrão” e dos setores liberais, militares e conservadores do Congresso Nacional, numa sequência de ataques e desmonte de direitos e garantias sociais conquistadas pela sociedade brasileira ao longo das últimas décadas.

Mudanças na legislação trabalhista e sindical, reforma da previdência, desmonte do SUS, tentativas de liberação de armas, revisionismo histórico, negacionismo climático, apologia à tortura, censura, submissão ao imperialismo, aumento de cerca de 80% nos incêndios e queimadas na nossa Amazônia, práticas que contribuem com a perpetuação do racismo, do machismo e da LGBTfobia, cortes bilionários na educação com impacto na assistência e permanência estudantil, na manutenção de bolsas de pesquisas e a destruição das Universidades e Institutos Federais. Em suma: vexame internacional e uma ameaça à democracia.

Os bilionários cortes na educação desvelam um projeto governamental destrutivo para a educação. A redução orçamentária anunciada no fim de abril de 2019 vem inviabilizando o funcionamento regular das Universidades, Institutos Federais e CEFETs. O ataque ideológico que esses cortes representam se alinham com os interesses privatistas que sempre rondaram a educação pública. Os primeiros cortes anunciados foram para a UFBA, UnB e UFF, sob o argumento de realizarem “balbúrdia” em seus espaços. Curiosamente, as mesmas que foram polos de resistência na última década contra os ataques dos governos. Depois, os cortes foram estendidos todas as instituições, impondo ao ensino, à pesquisa e à extensão uma crise que está travando o avanço da produção cientifica no Brasil. Também a educação básica, que segundo o governo seria a prioridade, vem sofrendo com o sub-financiamento nos últimos meses em todo o país.

Os e as lutadoras sociais e os comprometidos com os direitos dos/as trabalhadores/as e da juventude não tem tido descanso. Em meio a tantos ataques, tem crescido também a resistência popular nas ruas, escolas, universidade, periferias e nos mais diversos espaços. Os grandes atos dos últimos meses em diversas cidades brasileiras e protagonizados pela juventude e pelos movimentos estudantis e a última greve geral mostram que não iremos aceitar quietos e calados tantos ataques.

O desmonte do sistema público de ensino segue a todo vapor nos gabinetes palacianos. Enquanto a educação básica amarga com exorbitantes cortes orçamentários, pesquisadores brasileiros se veem ameaçados com a suspensão de inúmeras bolsas que garantem hoje o avanço da produção científica do Brasil e o governo luta para implementar o programa “Future-se” nas Universidades e Institutos Federais, ao mesmo tempo em que sangra a autonomia dessas instituições nomeando Reitores e interventores não eleitos pelas comunidades acadêmicas.

O “Future-se”, conforme aponta o professor Jorge Almeida e as professoras Magda Furtado e Rafaela Cardoso em artigo publicado pela Fundação Lauro Campos[1], é um enorme passo para o desmonte das IFES (Instituições Federais de Ensino Superior), dos IFs (Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia) e dos CEFETs, na medida em que essas instituições de ensino “seriam geridas por Organizações Sociais (OSs) privadas, mantidas por meio de Fundos de Investimento especulativos formados a partir da alienação de patrimônio público e outros financiamentos privados guiados pelo objetivo do lucro, sem qualquer garantia de orçamento federal para seu custeio”. Um ataque direto e brutal à autonomia universitária no âmbito acadêmico e financeiro, à carreira docente, aos recursos de assistência estudantil, à qualidade e às condições de ensino, ao desenvolvimento da pesquisa e da extensão e inclusive ao movimento estudantil.

Na prática, esse projeto é a materialização da “privatização de fato das Universidades e Institutos Federais e dos seus recursos físicos e intelectuais”, também através de uma disputa ideológica que “visa reforçar ainda mais a hegemonia burguesa na Universidade e na sociedade”[2]. Para além disso, os cortes implementados pelo Governo Federal e o Future-se tem impacto direto nas universidades estaduais brasileiras na medida em que o fim do financiamento de bolsas e ações de pesquisa e extensão (como as financiadas pela CAPES e CNPq) vai dificultar ainda mais o funcionamento das universidades estaduais que vem sofrendo os duros ataques por parte dos governos. Como parte desse pacote de maldades do governo federal, os docentes do ensino superior e da carreira da Educação Básica Técnica e Tecnológica (EBTT) também tem suas carreiras no alvo do governo, com ameaças a estabilidade, dentre diversos outros direitos, bem como a possível futura extinção destas através do Future-se.

 

Educação pública na Bahia: Governo Rui Costa, Universidades Estaduais e as O.S.

Se olharmos para o estado da Bahia, governado pelo PT, vemos um cenário igualmente caótico para a educação e o serviço público de modo geral. Os ataques aos servidores públicos ocorrem muito antes do governo Bolsonaro: aumento da alíquota previdenciária, congelamento do salário dos professores da educação básica, cortes no orçamento das universidades estaduais desde 2015, ataques aos direitos dos docentes do magistério superior, o fechamento de escolas públicas e a militarização de outras e, mais recentemente, a tentativa de terceirizar a gestão das escolas estaduais.

Se houve resistência quando Bolsonaro (assim como os governos que o antecederam) implementaram cortes no orçamento da educação, também houve resistência quando o governador da Bahia, Rui Costa (PT), começou a aplicar cortes no orçamento das 4 Universidades Estaduais da Bahia, as UEBAs (a UNEB – Universidade do Estado da Bahia [com 29 departamentos espalhados por 24 cidades], a UEFS – Universidade Estadual de Feira de Santana, a UESC – Universidade Estadual de Santa Cruz e a UESB – Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia) que chegaram a aproximadamente 40% dos recursos de manutenção e custeio e 80% dos recursos de investimentos.

A realidade das UEBAs nunca foi das melhores: sempre atacadas pelos governos e a eterna tentativa de desmonte do ensino superior público baiano. Concordando com Kyrlian Lima[3], “as dificuldades enfrentadas pelas universidades estaduais baianas não necessariamente resultam dos efeitos da conjuntura, da crise de 2008 ou do programa neoliberal orientado pelo Banco Mundial na América Latina, mas são condições estruturais de sua existência, da universidade brasileira, e da ciência e tecnologia latino-americana”. Todavia, nos últimos 5 anos os ataques se intensificaram com o aumento gradativo do percentual de verba contingenciada pelo governo estadual.

Enquanto o governador “moderniza” a Bahia com “obras tamanho G”, a educação (básica e superior) pena com um orçamento baixíssimo e sem incentivos à pesquisa, extensão ou assistência estudantil. O ensino superior público baiano vive em risco com o projeto de desmonte do atual governador Rui Costa, que após reeleito em 2018 afirmou que a educação seria uma prioridade de seu segundo mandato, e do secretário de educação Jeronimo Rodrigues. Os ataques às universidades estaduais e aos docentes acabaram por motivar, em 2019, uma grande greve docente e estudantil nas 4 UEBAs (83 dias de resistência) cuja pauta incluía direitos trabalhistas e repasse integral do orçamento das instituições de ensino (7% da RLI-Receita Liquida de Impostos para as UEBAs e 1% para a assistência estudantil). A greve, que foi duramente ataca pelo governo, inclusive com corte de salários [4].

A greve de 2019, conforme aponta a professora Caroline Lima[5], foi marcada pelo autoritarismo e perversidade de um governo autoproclamado progressista. O projeto de desmonte da coisa pública encontrou em Rui Costa (PT) um aliado, mas a greve das UEBAs desvelou o projeto de um Governador inimigo da educação e do funcionalismo público. O mesmo governo que dá o aval para que a Polícia Militar atue com violência brutal diante do povo negro e da juventude das periferias baianas.

Em meio a tudo isso, Rui Costa flerta com os ideais privatistas que rondam a educação pública, ao afirmar que a cobrança de mensalidade nas universidades públicas “não deve ser um tabu”[6] e, mais recentemente, através da Secretaria de Educação, publicou uma Portaria (770/2019) com um chamamento para a iniciativa privada assumir a gestão das escolas estaduais através de Organizações Sociais (OSs), tal qual Bolsonaro tenta fazer com as Universidades e Institutos Federais via “future-se”. Um claro alinhamento com a política bolsonarista de destruição do ensino público.

Outros quatro pontos que representam o projeto de precarização da educação do governo Rui ainda podem ser explorados. O primeiro é a Lei 13.459/2015 que cria o programa de auxílio permanência para os estudantes das Universidades Estaduais da Bahia que se encontram em condições de vulnerabilidade socioeconômica. De fato, essas bolsas fazem uma diferença na vida de inúmeros estudantes que saem de suas cidades para cursar a graduação em outros municípios. Todavia, o número ofertado ainda é muito abaixo das necessidades do enorme contingente de estudantes das UEBAs que necessitam desses auxílios. É preciso que se garanta condições de assistência e permanência estudantil para os estudantes das estaduais espalhados nas quase 30 cidades baianas, a maioria delas situadas no interior do estado.

O segundo foi a demora dos governos do PT na Bahia em revogar a lei estadual 7176/97 – sancionada no período do governo do PFL – que feria gravemente a autonomia das Universidades Estaduais. Outro ponto são os diversos ataques a carreira docente do magistério superior estadual ao aprovar na Assembleia Legislativa da Bahia projetos que mexem na estrutura da carreira do magistério superior no que tange às questões de carga horária e dedicação exclusiva, dentre outras questões, e que afetam diretamente o exercício do tripé universitário nas UEBA. Por último, cabe lembrar da grave situação da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB) que, nos últimos anos, vem sofrendo com grandes cortes, o que tem inviabilizado o suporte para o desenvolvimento de pesquisas no estado.

Não é mais possível negar que o Governo do petista Rui Costa na Bahia atua como um governo de políticas neoliberais e com várias concessões aos conservadorismos, com alianças com setores da direita e setores conservadores expressa na adesão às pautas das Igrejas Neopentecostais.

 

Os ataques às Universidades Estaduais do Paraná

O estado do Paraná, atualmente governado pelo governador Ratinho Junior, do PSD – partido nacionalmente alinhado com o governo Bolsonaro no Congresso e, na Bahia, principal aliado do Governo Rui do PT sob a liderança dos senadores baianos Otto Alencar e Ângelo Coronel – também vem sofrendo uma dura conjuntura na área da educação e do funcionalismo público. Com notícias de diversos ataques aos servidores públicos do PR, surge uma das maiores polémicas recentes na área da educação: a Lei Geral das Universidades Estaduais do Paraná-LGU.

Trata-se de um projeto do governo, atualmente em debate nas 7 Universidades Estaduais do Paraná (Universidade Estadual de Londrina-UEL, Universidade Estadual de Maringá-UEM, Universidade Estadual do Paraná-UNESPAR, Universidade Estadual de Ponta Grossa-UEPG, Universidade Estadual do Centro-Oeste-UNICENTRO, Universidade Estadual do Norte do Paraná-UENP e Universidade Estadual do Oeste do Paraná-UNIOESTE), que se seguir em frete, vai para a Assembleia Legislativa do Paraná como Projeto de Lei.

Em síntese, o projeto é semelhante, em alguns pontos, ao Future-se e é a versão jurídico-legal do projeto que o Governo da Bahia vem aplicando nas UEBAs. O projeto, que ataca diretamente a autonomia das Universidades, traz diversas propostas avaliadas como sendo de alto risco, como por exemplo a mudança da natureza das Universidade, que deixariam de ser autarquia especial para serem subordinadas ao Governo, a criação de um conselho de Reitores que seria superior aos conselhos universitários, retirada da autonomia de gestão orçamentária das Universidades, criação de uma fórmula de aluno equivalente que servirá de parâmetro para o custeio das Instituições se considerar os índices de pesquisa e extensão, redução drástica da contratação de professores e técnicos administrativos, precarização do trabalho docente com aumento de carga horária, terceirização de diversos serviços, dificuldades para a criação de novos cursos e fechamento de algumas graduações[7].

Em números, podemos ver o risco que a LGU oferece para as Instituições Estaduais de Ensino Superior do Paraná. Uma Lei estadual (16.555/2010) define que, por exemplo, a UEL deveria ter 1.956 docentes. Atualmente, a UEL tem 1345 professores (31% a menos do que legalmente deveria ter). Com a LGU, a UEL passaria a ter 1090 docentes (866 a menos do que prevê a lei de 2010), o que representaria um grave quadro no funcionamento da Instituição. A LGU reduziria em 46% o número de servidores técnicos – uma média de 700 servidores a menos. Na prática, a LGU, além de atacar gravemente à carreira docente, vai acarretar no fechamento de cursos, na redução da qualidade dos serviços prestados para a comunidade e no adoecimento de professores, técnicos e estudantes em virtude da sobrecarga de trabalho e demandas acadêmicas. A LGU em muito se parece com a antiga Lei 7176/97 do Estado da Bahia, bem como se parece com o Future-se em essência e forma. Com a aprovação desse projeto, a permanência dos estudantes nas IEES do Paraná fica em risco, na medida em que o governo não dá nenhuma garantia de repasse de recursos para a área, e o que vem sendo aplicado na prática é o corte de recursos das Universidades estaduais do Paraná.

O projeto, visto como inconstitucional por diversos setores da sociedade paranaense, é um retrocesso para o ensino superior público do Paraná e pode acabar na privatização das Universidades Estaduais. A luta dos estudantes, servidores e docentes das IEES do Paraná contra a LGU gerou uma grande e mobilizada greve que durou de junho até agosto de 2019. Docentes e estudantes seguem em estado de alerta, mobilização, resistência e luta contra os ataques do Governador Ratinho Jr.

 

A educação pública em risco: quais são as nossas tarefas?

Como podemos observar, a política bolsinarista não fica restrita aos gabinetes e palácios do planalto central. Enquanto Bolsonaro (PSL) e Weintraub lutam para impor um “future-se”, que mais é um fature-se – mas somente para a iniciativa privada – a educação nos estados sofre ataques absurdamente semelhantes. Os projetos destrutivos de Bolsonaro encontram aliados nos governos da Bahia e do Paraná. Rui Costa (PT) e Ratinho Junior (PSD) tem se mostrado aliados de primeira ordem do bolsonarismo, quando o assunto é atacar e precarizar a educação. Os ataques à carreira docente, a autonomia universitária, os cortes orçamentários e a baixa nos recursos para assistência estudantil são pontos semelhantes entre os governos e representam o projeto de desmonte da educação pública que está em curso em todo o país atualmente.

Combater esses projetos é tarefa de primeira ordem. Urge a necessidade de nos unirmos em defesa das nossas universidades públicas estaduais, federais e dos institutos federais. O movimento docente, o movimento estudantil e toda a juventude, juntamente com a sociedade civil devem atuar coletivamente na defesa de nosso patrimônio, na defesa dos nossos direitos e contra o desmonte do ensino brasileiro. A hora é de grandes mobilizações para mostrar aos governos nossa força e nossa resistência. Em tempos de ataques, resistir e lutar são as saídas. Necessária a criação de um comando nacional de mobilização estudantil, pela base, que paute em todo o país uma agenda organizada de lutas em defesa do caráter público, gratuito e autônomo de nossas universidades.

 

Basta de Bolsonaro!

Basta do Bolsonarismo de Rui Costa!

Basta dos retrocessos de Ratinho Junior!

Contra o desmonte da educação pública!

 

“Se o presente é de luta, o futuro nos pertence” (Che Guevara).

 

[1]  https://www.laurocampos.org.br/2019/08/14/future-se-o-exterminador-do-futuro/

[2]  https://www.laurocampos.org.br/2019/08/14/future-se-o-exterminador-do-futuro/

[3] https://acaopopularsocialista.com/2019/04/24/balanco-das-univ-estaduais-da-bahia-em-greve/

[4] https://acaopopularsocialista.com/2019/04/26/rui-costa-pt-ba-corta-salario-dos-docentes-em-greve/

[5] https://acaopopularsocialista.com/2019/06/29/greve-das-ueba-desvela-governo-antipopular-na-bahia/

[6] https://www.bahianoticias.com.br/noticia/235941-rui-defende-discussao-sobre-cobranca-de-mensalidade-em-universidades-publicas.html

[7] http://www.sinduepg.com.br/noticias/ler/644/SINDUEPG_ALERTA_QUE_LEI_GERAL_DAS_UNIVERSIDADES_VISA_PRIVATIZACAO_DAS_UNIVERSIDADES_ESTADUAIS_DO_PARANA

 

*Rafael Bomfim Souza, militante do coletivo de juventude Pajeú e da Ação Popular Socialista (APS/PSOL), bacharelando em Direito pela Universidade do Estado da Bahia-UNEB e presidente do Diretório Acadêmico Cosme de Farias (Direito-UNEB)

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Os Artigos assinados não representam necessariamente a posição do Site da APS.

Veja também:

https://acaopopularsocialista.com/tag/rui-costa/

Governador Rui Costa ataca. Educadores resistem e vencem.

Rui Costa (PT-Bahia) aplica políticas da direita

Greve das UEBA desvela governo antipopular na Bahia

 

 

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