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Contribuição da APS ao DNPSOL

A eleição de Lula foi uma vitória da luta democrática e popular

A vitória de Lula é de grande significado histórico. Derrotamos o uso do Estado, as Fake News, a instrumentalização das igrejas evangélicas, os grupos neofascistas, parte da mídia empresarial, as chantagens das Forças Armadas, a maioria da direita expressa no “Centrão” e parte do capital que se envolveu na campanha, do financiamento ao assédio.

Foi uma vitória da mobilização popular que enfrentou as intimidações da extrema-direita. Assim, criaram-se condições para bloquearmos as privatizações e quebra de direitos, que se aprofundariam caso Bolsonaro vencesse, com possível fascistização do regime. A vitória de Lula significa uma alteração conjuntural na correlação de forças em nível nacional, regional e internacional, melhorando-a para os setores democráticos, populares.

Essa vitória deve ser garantida. Parte da base de Bolsonaro continua em ação, preservada política e estruturalmente com ganho de espaços institucionais, especialmente no Rio de Janeiro e São Paulo.

A diferença apertada reflete a polarização de uma vitória que nunca esteve “garantida”. O resultado esteve dentro de uma histórica divisão “esquerda” x “direita”, onde a extrema direita se fortaleceu dentro da direita.

A tendência principal é que Lula seja empossado. Por outro lado, o Governo deve encarar uma oposição dirigida pela extrema-direita que tem um projeto autoritário vinculado ao neofascismo. Bolsonaro pode tornar-se a principal liderança desse campo, com força para não ser punido por seus crimes e buscar nova candidatura em 2026. 

Nas eleições para o Congresso Nacional o resultado foi desfavorável, mas não muito diferente da primeira vitória de Lula em 2002. Houve fortalecimento relativo de setores da extrema-direita, especialmente no Senado. Há também maior influência desses setores no Poder Judiciário, nas Forças Armadas, nos aparelhos coercitivos e expressiva base de massas mobilizada regularmente.

O contexto de 2023 é diferente de 2003. Isso exige das forças democráticas, populares e socialistas uma criteriosa avaliação tática e estratégica dos desafios que estão postos.

O PSOL nas eleições de 2022

A decisão da tática eleitoral do PSOL ocorreu após longo debate sobre ter ou não candidatura própria. Nesse processo, afirmávamos que a tendência principal era uma eleição em dois turnos e que Lula não formaria uma Frente de Esquerda, mas sim uma Frente Ampla com apoio, ou benevolência, de frações do capital e da direita e que a eleição seria difícil, pois Bolsonaro tinha recursos políticos e econômicos à sua disposição. 

Foi nessa perspectiva que apontávamos que uma candidatura própria do PSOL – defendemos a pré-candidatura de Glauber Braga – contribuiria para defender questões programáticas à esquerda e, ao mesmo tempo, estaríamos somando forças na crítica a Bolsonaro, colocando questões que Lula não pautaria por limites programáticos ou para não perder fatias do eleitorado. Nossa posição também era nítida em dois aspectos: a possibilidade de retirar a pré-candidatura a depender do quadro eleitoral e que no 2º turno estaríamos com Lula para vencer Bolsonaro. 

Essa não foi a posição majoritária no partido, mas isso não impediu sua unidade que, somado ao capital político anterior, foi fundamental para seu acúmulo. O PSOL obteve crescimento na faixa de 20% de sua bancada na Câmara Federal (indo de 10 para 12 deputados) e nas Assembleias Legislativas (indo de 18 para 22 deputados) em comparação com 2018. Conseguiu ultrapassar a clausula de barreira sem depender da Rede.

Esse crescimento se deu quase todo no sudeste (principalmente em SP). No Norte, o PSOL perdeu um Deputado Estadual (AP) e um Deputado Federal (PA). No Nordeste, manteve o peso institucional de 2018 em PE, BA e CE (um deputado estadual cada) e manteve o mandato conquistado em SE, mas não eleito pelo partido em 2018. Norte e Nordeste não conseguiram eleger um Deputado Federal e em alguns estados teve redução de votos. Situação similar no Centro-Oeste. Nossas bancadas devem ser motivo de orgulho de toda nossa militância. Elas são frutos do diálogo que o partido realiza com os explorados e oprimidos em suas múltiplas identidades.

Algumas análises enviesadas ignoram que só se chega a esse patamar com um processo de acúmulo prolongado e não em consequência de uma tática específica. Se fosse assim, no Nordeste – onde Lula teve 70% dos votos – o PSOL teria grande crescimento, mas o que vimos foi estabilidade. Nos principais resultados eleitorais do partido (SP e RJ) a trajetória do PSOL como partido independente – com candidaturas próprias nas principais eleições anteriores – foi fundamental. A tática de apoio a Lula já no primeiro turno é uma variável importante da análise, mas não a única.  

A questão da Hegemonia e a posição do PSOL diante do Governo Lula

É preciso aprofundar porque, apesar do desastre do governo Bolsonaro, foi difícil vencer. Não se pode responsabilizar apenas a ascensão do bolsonarismo para compreendermos isso. É importante localizar que a campanha ocorreu 20 anos após a primeira eleição de Lula e no âmbito do fortalecimento da hegemonia burguesa no Brasil desde então.

Nesse período, a esquerda e os movimentos populares desacumularam política, ideológica e organizativamente. As vitórias eleitorais ou os acúmulos parciais de parte dos movimentos sociais não devem nos cegar. A hegemonia burguesa não foi amplamente enfrentada nesta campanha, nos governos anteriores do PT, no governo Temer e nem durante o governo Bolsonaro, que teve uma oposição vacilante da maioria das forças democráticas e populares.

Na campanha muitas concessões foram feitas à ordem burguesa, que saiu mais legitimada. O aplaudido STF tentará tutelar o novo governo, mesmo modo de agir que terão o conjunto do Estado (e as Forças Armadas em particular), o grande capital, a grande mídia empresarial e a sociedade civil burguesa. É o que já se observa na transição. 

Lula aposta na governabilidade por cima, negociando com o grande capital e a elite política de direita, e numa melhora nas condições de vida do povo. Não tem interesse em promover mobilizações populares nem agora, contra os golpistas, tão pouco depois. Para sua tática de governabilidade, essas mobilizações podem assustar o grande capital e setores da direita, que ele quer como base.

Diante de um quadro social desolador, o governo terá que responder a um passivo grande de demandas populares. Tende a realizar medidas progressivas que podem melhorar as condições mais básicas da vida do povo. Para isso, deve contar com o apoio do PSOL, lutando para torná-las políticas de Estado e para ampliar a quantidade de beneficiados dos setores populares. 

Mas é preciso afirmar que essas medidas não afetarão a essência da política macroeconômica neoliberal, mesmo relativizando a “responsabilidade fiscal”. Muito menos a ordem econômica e social capitalista, submetida ao imperialismo.

O PSOL deve priorizar as mobilizações populares para garantir os direitos existentes e a revogação do teto de gastos e do corte do orçamento das políticas públicas. Devemos lutar para reverter às privatizações e a quebra de direitos previdenciários e trabalhistas, bem como impedir uma reforma administrativa regressiva, temas tratados de modo ambíguo na campanha e na transição. Também é fundamental a retomada do aumento real do salário-mínimo e a recuperação das perdas salariais dos servidores públicos.

As expectativas materiais da maioria do povo são significativas, mas as expectativas políticas e ideológicas estão rebaixadas, podendo ser “atendidas” com medidas “melhoristas”, sem reformas sociais ou um revogaço amplo. Isso poderá trazer apoio passivo ao governo, como já aconteceu. 

Mas isso não será mudança qualitativa da realidade. O governo Lula/Alckmin será o que se convencionou chamar de “centro-esquerda”, aliado com a direita e procurando apoio da esquerda, de modo a conter a autonomia e a crítica dos movimentos, partidos e organizações populares.

O PSOL corre o risco de ser engolido, caso entre no mandato de Lula, por um governo que não se opõe à hegemonia burguesa, tendo como horizonte melhorias nas condições de vida do povo em padrões rebaixados.

Para a esquerda que tem uma perspectiva estratégica socialista, há um duplo desafio: enfrentar os demônios do neofascismo bolsonarista e mobilizar os movimentos populares para conquistar vitórias imediatas e acumular forças numa perspectiva estratégica. O PSOL está bem posicionado para cumprir essa tarefa.

Por isso a independência do PSOL frente ao Governo Lula é fundamental e não cumpre só papel tático: trata-se de consolidar e fortalecer uma alternativa política e partidária ampla para apresentar ao povo trabalhador um projeto de esquerda de caráter antimonopolista, anti-imperialista, antilatidundiário, ecossocialista, democrático radical e contra todas as opressões.

A tática posta para o momento não é ser oposição ao Governo Lula. O cenário atual coloca para a esquerda o desafio prioritário de derrotar o bolsonarismo. Para cumprir esse objetivo devemos ser um partido combativo no parlamento e ancorado nas lutas de nosso povo, articulando bem essas duas dimensões da luta contra o bolsonarismo.

Impõe-se para a esquerda, e o PSOL em especial, conquistar capilaridade na base da sociedade, disputando nosso povo para um projeto nacional mais avançado do que Lula e o PT oferecem. A crise global e as disputas inter-imperialistas – que abrem espaços para projetos nacionais autônomos – associada à possibilidade de um novo patamar para a construção do PSOL, criam condições para tornar nosso partido uma alternativa real para o povo brasileiro. E nossa independência agora é um importante pilar para nossa construção do presente e do futuro.

Coordenação Nacional da APS/PSOL

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