Por Denise Carneiro*
Essa Pandemia está exercitando a criatividade retórica dos profissionais de mídia. Os termos “reegenharia”, “5 S”, “modernização da CLT”, “flexibilização do trabalho” etc., cederam lugar ao “novo normal no mundo do trabalho”, com a pandemia impondo a criação de recursos tecnológicos a ampararem essa nova onda de mudança no formato do trabalho. Porém o que vemos claramente é uma maior concentração de lucros dos que estão no topo da pirâmide social com o fortalecimento das grandes empresas, enquanto o micro e pequeno empresário sofrem riscos de pauperização. Já para o trabalhador, base da pirâmide, sobra ainda mais exploração e miséria. A Uberização, para citar um exemplo, que já estava consolidada antes da pandemia, alcança agora recordes em pedidos de entrega domiciliar, contrastando com redução da renda dos empregados desses aplicativos, num claro aumento da mais valia.
Uma pesquisa recente, feita pela “Rede de Estudos e Monitoramento da Reforma Trabalhista (Remir Trabalho)”, comprova a redução do rendimento do trabalho mesmo com aumento da jornada e da produção, como foi o caso das empresas de aplicativos. Vimos grande redução salarial nessa pandemia, quando o trabalhador mais precisa de apoio e garantia de direitos, mas o governo pratica criminosamente uma de suas bandeiras de campanha: colocar nas mãos do trabalhador a escolha entre direitos ou emprego. Vimos que com toda essa política oligárquica, que tem o discurso falacioso da manutenção/geração de emprego, o nível de empregabilidade segue caindo desde antes da pandemia jogando milhões à fome sem que o governo atue para impedir. Nesse momento era necessário que o governo injetasse recursos no amparo ao desempregado, ao trabalhador informal, MEI, Micro e pequenas empresas (que são os quem mais empregam no País), mas ao contrário, o ministro da economia Paulo Guedes, naquela reunião tenebrosa de ministros (ou reunião de ministros tenebrosos?), falou que o governo não poderia “perder dinheiro ajudando os pequenos”! Na mesma frase ele anunciou ter colocado uma “granada” no bolso dos “inimigos”: trabalhadores públicos! E no mesmo mês liberou mais R$ 1,3 trilhões aos bancos. É, esse governo tem lado, e não é o de quem lê esse artigo.
Quem pode ficar em casa, mesmo sem querer, tem elevado a bolha de quem faz teletrabalho. E esse “mesmo sem querer” é um importante elemento nessa equação: Esses não estão em TELETRABALHO: estão em CONFINAMENTO em defesa da vida! E vemos essa situação ser aproveitada pelas empresas privadas e públicas para impor elevação de jornada, mais metas de produtividade, redução de benefícios etc., como se esses trabalhadores estivessem em casa por opção ou estivessem todos em situação normal. Não! Não estão em casa por opção e não estão em situação de normalidade! Muitos estão com filhos pequenos em casa os requisitando, filhos maiores os tensionando, pais e mães idosos a merecer mais atenção e cuidado, sem falar nas tarefas domésticas e de higienização elevadas exponencialmente, tensão, medo do contágio, medo de perder o emprego ou ter redução salarial, medo de perder um parente, utilizando seus próprios insumos para as tarefas, sofrendo suas doenças sem poder ir ao médico, sem poder contar com ajuda emocional nem psicológica, sem lazer, presos em casa.
O índice de violência contra a mulher tem crescido substancialmente nessa situação, mostrando que até entre os oprimidos há quem sofra ainda maior opressão. Além de nada disso ser considerado, o governo quer reduzir salários de quem, segundo o ministro da economia “está em casa com a geladeira cheia”, provando que trabalhador com geladeira cheia virou crime nesse País estranho. País com um governo desse não pode ser considerado um País sério!
Voltando ao título dessa missiva, é preciso entender que, quem pode estar em casa não está em teletrabalho: está em confinamento! E sofre com problemas de toda ordem, tensão, medo, angústia, cansaço físico e mental por ele acarretados, e mais ainda: sem poder ir às ruas contra a precarização e escalada do autoritarismo. E quem precisa ir às ruas trabalhar prefere não se arriscar ainda mais participando de atos e passeatas em defesa dos seus parcos direitos. Louvo às torcidas organizadas que tomaram a frente da resistência, para evitar o pior, e aqui novamente relembro do tenebroso ministro da economia quando disse que “vamos melhorar economicamente porque seria impossível piorar mais do que está”. Ledo engano, ministro: a ladeira abaixo onde vocês nos colocaram pode sim piorar, pode sim matar ainda mais pessoas, principalmente pretos e pobres, pode sim matar pessoas por causa do ódio e intolerância autorizadas por esse governo, pode sim fazer o mundo temer o Brasil (lembrem-se do fechamento das fronteiras), e além do confinamento pela COVID, pelo desemprego, pelo medo, pela fome, vamos ficar confinados em um País non grato no mundo.
Porém, a história não acaba aqui, e junto às torcidas organizadas, demais trabalhadores formais e informais, estudantes etc., entraremos em campo e viraremos esse jogo em favor do sofrido, mas heróico povo brasileiro! Exigimos respeito à vida, garantia de direitos, geração de empregos, e democracia.
*Militante da APS/PSOL, membra da Auditoria Cidadã e da CSP Conlutas-BA
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