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Na noite desta quarta-feira (23-11), o Senado aprovou a PEC 36/2016, de autoria dos tucanos Aécio Neves (MG) e Ricardo Ferraço (ES), que estabelece cláusula de barreira para que partidos tenham acesso ao fundo partidário e tempo de rádio e televisão, além de estrutura própria de funcionamento legislativo.

Foram 63 votos favoráveis e 9 contrários. Agora, a proposta segue para a Câmara dos Deputados.

A proposta foi aprovada foi o substitutivo de Aloysio Nunes (PSDB/SP), que também acaba com as coligações proporcionais a partir das eleições de 2020.

Segundo o texto, os partidos só terão acesso ao fundo partidário e à propaganda gratuita em rádio e TV se obtiverem, no pleito para a Câmara dos Deputados, pelo 2% dos votos válidos em, pelos menos, 14 unidades da Federação, com um mínimo de 2% dos votos válidos em cada uma. Nas eleições de 2022, o percentual passa a ser 3% dos votos válidos, também com um mínimo em 2% dos votos em 14 unidades da Federação.

Caso a proposta estivesse em vigor hoje, atingiriam a cláusula de barreira apenas PMDB, PSDB, PT, DEM, PDT, PP, PR, PSD, PSB, PRB e PTB.

Veja a seguir o artigo do deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) sobre o assunto:

Congresso deve aprovar cláusula de desempenho para partidos? NÃO.

Por Chico Alencar

Partido político é uma associação cidadã livre e laica, que, ao expressar interesses de grupos e classes sociais,
tem visão de mundo e projeto de nação, disputando o poder para implementar políticas coerentes com seus princípios e programa. Quantos partidos no Brasil correspondem a essa definição?

Entre nós, há 35 siglas com registro legal e outras tantas em formação, de acordo com o TSE.

As aparências enganam: democrático pode ser autoritário; social democrata, elitista; trabalhista, populista; socialista, capitalista; republicano, oligárquico; progressista, atrasado…

Partidos ditos grandes, acometidos de “nanismo ético”, alugam apoios de médios e pequenos. Partido, ente coletivo universalizador de demandas, tem sido, no Brasil, ajuntamento eleitoreiro para disputar pedaços do Orçamento público.

Agora o setor hegemônico de um sistema político com as vísceras expostas pela Lava Jato propõe não uma reforma política com participação popular, mas remendos para garantir sua sobrevida.

O que se busca, nesta desgastada legislatura, é restringir o acesso da diversidade socioideológica ao condomínio do poder. A maioria, cristalizada, quer impedir a minoria de crescer.

É fato que fundar um partido político no Brasil virou bom negócio, como uma franquia de sucos, só que nada saudável. Pode-se ver aos montes os chefetes cartoriais, usufrutuários de recursos públicos e dos ganhos no mercado eleitoral de tempo de TV e rádio.

Por outro lado, a proliferação é compreensível numa sociedade cada vez mais fragmentada, com a exacerbação de particularismos. Em muitos países, como Espanha e Polônia, a descompressão pós-autoritarismo gerou centenas de organizações partidárias. Com o tempo, só as de maior solidez programática sobreviveram.

Aos defensores da monopolista cláusula de barreira, edulcorada como de “desempenho”, convém lembrar que ela já existe -e não só pelo filtro do modelo político que, apesar do providencial fim do financiamento empresarial, continua colonizado pelo dinheiro, que compra mandatos com traficância de clientela eleitoral.

Partidos com pequenas bancadas têm menos recursos do fundo partidário e menos tempo nos meios de comunicação, além dos regimentos das casas legislativas limitarem seus direitos de estrutura, fala e até de apresentação de destaques na votação de projetos.

O essencial é a questão democrática. O fim das coligações nas eleições proporcionais já provocará uma grande decantação, pois as legendas fisiológicas perderão um “ativo” negocial importante.

Estrangular o funcionamento dos partidos, mesmo os que elegerem mandatários, a partir de um arbitrário percentual de votos, é, como disse o ministro do STF Marco Aurélio Mello em julgamento de 2006, “regra extravagante e injusta”, “porque coloca na vala comum partidos como o PPS, o PC do B, o PV e o PSOL, que não podem ser tidos como partidos de aluguel”.

Quem propõe essa barreira são os partidos beneficiários -em tamanho, recursos e estrutura- de um modelo fundado na promiscuidade público-privada e no uso da máquina governamental.

O correto seria um marco inaugural que oferecesse a todos, isonomicamente, condições de igualdade na apresentação de suas propostas ao juízo da cidadania.

O ex-presidente do STF, Carlos Ayres Britto, no mesmo julgamento de 2006 citado acima, foi contundente ao caracterizar a proposta de barreira como “cláusula de caveira”, pois poderia levar os pequenos partidos à morte.

E a atual presidente, Cármen Lúcia, comentou na ocasião que “a minoria de hoje tem que ter espaço para ser maioria amanhã”.

Só com mais democracia e disputa de ideias livraremos a política da politicagem reinante.

Artigo publicado originalmente no site da Folha de São Paulo

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